ALLAN KARDEC

segunda-feira, 25 de junho de 2012

ESQUECIMENTO DAS VIDAS PASSADAS







NECESSIDADE MORAL DO ESQUECIMENTO DAS VIDAS ANTERIORES, segundo o filósofo espírita LÉON DENIS



" Para a maior parte dos homens, frágeis "canas pensantes" que o vento das paixões agita, não se nos afigura desejável a recordação do passado, pelo contrário, parece indispensável ao seu adiantamento que as vidas anteriores se lhes apaguem momentaneamente da memória.
A persistência das recordações acarretaria a persistência das idéias errôneas, dos preconceitos de casta, tempo e meio, numa palavra, de toda uma herança mental, de um conjunto de vistas e coisas que nos custaria tanto mais a modificar, a transformar, quanto mais vivo estivesse em nós. Deparar-se-iam assim muitos obstáculos à nossa educação, aos nossos progressos; nossa capacidade de julgar achar-se-ia muitas vezes adulterada desde o berço. O esquecimento, ao contrário, permitindo-nos aproveitar mais amplamente os estados diferentes que uma nova vida nos proporciona, ajudan-nos a reconstruir nossa personalidade num plano melhor; nossas faculdades e nossa experiência aumentam em extensão e profundidade.
Outra consideração, mais grave ainda. O conhecimento de um passado corrupto, conspurcado, como deve suceder com o de muitos de nós, seria um fardo pesado.
Só uma vontade de rija têmpera pode ver, sem vertigem, desenrolar-se uma longa série de faltas, de desfalecimentos, de atos vergonhosos, de crimes talvez, para pesar-lhes as consequências e resignar-se a passar por elas. A maior parte dos homens atuais é incapaz de tal esforço. A recordação das vidas anteriores só pode ser proveitosa ao Espírito evolvido, bastante senhor de si para suportar-lhe o peso sem fraquejar, com suficiente desapego das coisas humanas para contemplar com serenidade o espetáculo de sua história, reviver as dores que padeceu, as injustiças que sofreu, as traições dos que amou. É privilégio doloroso conhecer o passado dissipado, passado de sangue e lágrimas, e é também causa de torturas morais, de íntimas lacerações. As visões que se lhe vinculam, seriam na maioria dos casos, fonte de cruéis inquietações para a alma fraca presa nas garras do seu destino. Se as nossas vidas precedentes foram felizes, a comparação entre as alegrias que nos davam e as amarguras do presente, tornaria estas últimas insuportáveis. Foram culpadas? A expectativa perpétua dos males que elas implicam paralisaria a nossa ação, tornaria estéril nossa existência. A persistência dos remorsos e morosidade da nossa evolução far-nos-iam acreditar que a perfeição é irrealizável!
Quantas coisas, que são outros tantos obstáculos à nossa paz interna, outros tantos estorvos para a liberdade, não quiséramos delir da nossa vida atual? Que seria, pois, se a perspectiva dos séculos percorridos se desenrolasse sem cessar, com todos os promenores, diante da nossa vista? O que importa é trazer consigo os frutos úteis do passado, isto é, as capacidades adquiridas; é esse o instrumento de trabalho, o meio de ação do Espírito. O que constitui o caráter é também o conjunto das qualidades e dos defeitos, dos gostos e das aspirações, tudo o que transborda da consciência profunda para a consciência normal.
O conhecimento integral das vidas passadas apresentaria incovenientes formidáveis, não só para o indivíduo, mas também para a coletividade; introduziria na vida social elementos de discórdia, fermentos de ódio que agravariam a situação da Humanidade e obstariam a todo progresso moral. Todos os criminosos da História, reencarnados para expiar, seriam desmascarados; as vergonhas, as traiçoes, as perfídias, as iniquidades de todos os séculos seriam de novo assoalhadas à nossa vista. O passado acusador, conhecido de todos, tornaria a ser causa de profunda divisão e de vivos sofrimentos.
O homem, que vem a este mundo para agir, desenvolver suas faculdades, conquistar novos méritos, deve olhar para a frente e não para trás. Diante dele abre-se, cheio de esperanças e promessas, o futuro; a Lei Suprema ordena-lhe que avance resolutamente e, para tornar-lhe a marcha mais fácil, para livrá-lo de todas as prisões, de todo peso, estende um véu sobre seu passado. Agradeçamos à Providência Infinita que, aliviando-nos da carga esmagadora das recordações, nos tornou mais cômoda a ascensão, a reparação menos amarga.
... Nenhum poder é capaz de fazer que o passado não tenha existido!
Em muitos casos seria mais atroz saber do que ignorar.
... Pode a Justiça Eterna conformar os seus planos com as nossas vistas efêmeras e variáveis?
... A Justiça é eterna porque é imutável. O esquecimento temporário de nossas faltas não evita o seu efeito. É necessária a ignorância do passado para que todas a atividade do homem se consagre ao presente e ao futuro, para que se submeta à lei do esforço e se conforme com as condições do meio em que renasceu."





( texto extraído do livro " O Problema do Ser, do Destino e da Dor ", de Léon Denis, editora da FEB  ).
   

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